Chimarrão é um legado dos índios Guaranis




“O uso dessa bebida é geral aqui. Toma-se ao levantar da cama e depois várias vezes ao dia. A chaleira de água quente está sempre ao fogo e logo que um estranho entra em casa se lhe oferece o mate”. Estas são palavras do naturalista francês Auguste de Saint Hilaire, após visita em solo gaúcho por volta do ano de 1820.



Bebida símbolo do Rio Grande do Sul, o chimarrão é um legado dos índios Guaranis. Sempre presente no dia a dia, constitui-se de uma das tradições mais representativas deste povo. É também conhecido como mate amargo, mas não tem nada de amargo em seu significado: é sinônimo da hospitalidade e da amizade do gaúcho.

Tradicionalmente é cevado sem açúcar (antigamente o mate doce era essencialmente feminino), preparado em uma cuia (obtida a partir do porongo ou cabaça) e sorvido através de uma bomba. É a bebida proveniente da infusão da erva-mate, planta nativa das matas sul-americanas, inclusive do Rio Grande do Sul.

Segundo a 1ª Prenda do Rio Grande do Sul, Jéssica Thaís Herrera, “o chimarrão percorre de mão em mão, transportando a história, a cultura e a essência do povo gaúcho. Por isso, nas rodas de mate reina a liberdade, a igualdade e a humanidade, fazendo jus à titulação de símbolo da hospitalidade”, afirma.

História

Assim como é comum comer acarajé quando se visita Salvador, ou pão de queijo quando se vai a Minas Gerais, impossível visitar o Rio Grande do Sul sem experimentar o chimarrão. Contam os historiadores que sua descoberta está atrelada aos Guaranis das terras do município paranaense de Guaíra – cerca de 3.000 indígenas famosos por sua vitalidade, força, alegria e hospitalidade, graças ao consumo da infusão dessa espécie de chá, com folhas fragmentadas da erva-mate. É o que hoje chamamos de chimarrão, bebida que se espalhou não só pelo Sul do Brasil mas também por outros estados e países vizinhos.

Preparo

A constituição do chimarrão é fácil. É composto por uma cuia, uma bomba, erva-mate e água quente, seguidos de algumas regrinhas que veremos a seguir. Para iniciar o mate tradicional, a cuia deve ser necessariamente de porongo. A bomba, por sua vez, nos primórdios era de feita de taquara (bambu), mas nos dias atuais, preferem-se outros materiais, como o metal.

A erva-mate é o segredo do chimarrão, ela define o sabor da bebida, que em geral tem um amargor típico, também podendo ser defumada ou ainda contar com misturas de chás (essa mistura é conhecida como “mate jujado”). Essa erva é originária das folhas e caules finos da árvore Ilex paraguariensis e para estar pronta para o uso, passa por vários estágios de secagem, torragem e trituração.

Sem esquecer que a água, embora quente, não pode estar fervendo para que, com seu calor excessivo, não “queime” a erva (nem a boca) e tire as propriedades medicinais da bebida. É o que nos explica a tradicionalista Priscila Tisott, avaliadora oficial do Movimento Tradicionalista Gaúcho e Prenda do Rio Grande do Sul por três ocasiões: “costuma-se dizer que para que a água esteja na temperatura certa, deve-se desligar o fogo ao chiar da chaleira”, acrescenta Priscila.



Propriedades do chimarrão


Rico em vitaminas B1, B2 e C, bem como em sais de cálcio, ferro, sódio e magnésio, é considerado por estudiosos como um estimulante geral, tanto motor quanto vegetativo, além de diminuir a fome, auxiliar na digestão, combater a fraqueza e curar ressaca! E não para por aí: em “História do Chimarrão”, o folclorista Luiz Carlos Barbosa Lessa afirma ainda que o chimarrão desperta funções de inteligência, diminui a sensação de sede e a fadiga, tonifica o coração, diminui a produção de ureia, ajuda na função renal e ainda combate o cansaço intelectual.

O mate e seus significados

No Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul são mais de 77 mil hectares colhidos de erva-mate em 2016 no Brasil.

Em “Cevando o Mate”, o escritor Glênio Fagundes retrata algumas facetas históricas, antropológicas e culturais do chimarrão como, por exemplo, variações na forma de consumo da bebida que falam por si. Alguns significados podem ser percebidos de acordo como se oferece a bebida:

Mate com canela: só penso em ti

Mate com mel: quero casar contigo

Mate frio: desprezo-te

Mate enchido pelo bico da bomba: vás embora

Mate com sal: não apareças mais aqui

Mate servido com a mão esquerda: você não é bem-vindo (a)

Mate com açúcar: simpatia


Combinações gastronômicas

A importância gastronômica dessa bebida é de muita notoriedade e sua principal característica é ser uma bebida degustada coletivamente, hábito derivado da tradição dos Guaranis de compartilhar a erva cevada em rituais comunitários. E como símbolo da hospitalidade, geralmente a cuia de chimarrão vem acompanhada de boa conversa e algumas delícias típicas: bolinho de chuva, pipoca, cueca virada, cuca, dentre outras.

Além de ser matéria-prima para o chimarrão, de uma forma bastante inusitada a erva-mate tem sido utilizada como ingrediente para diversas receitas: sorvetes, mousses, bolos, farofas, rapaduras, trufas, patês, pães, panetones, alfajores, risoles e até pizzas. Seu sabor de identidade é notório em todas as receitas.

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