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Localizar devedores pelo Facebook




Se as redes sociais viraram ferramentas para encontrar os amigos, o setor de cobrança tem usado a mesma estratégia para achar os inadimplentes. Digitando o nome do devedor, a empresa consegue localizá-lo pelo Twitter ou pelo Facebook e pode descobrir pistas sobre o seu paradeiro. O que para os amigos não passa de informações básicas, para o cobrador são valiosas. 

Por meio das redes, ele pode saber a cidade onde a pessoa vive e o local de trabalho, por exemplo. Dessa forma, o meio virtual se transformou em um precioso banco de dados. 

Por isso, o usuário da rede precisa ficar atento para não virar vítima de golpes.

Segundo pesquisa do Ibope, 77,8 milhões de brasileiros usam a internet. Em média, por ano, o internauta brasileiro passa 69 horas em frente à telinha do computador. Os sites de redes sociais chegaram a quase 40 milhões de usuários, colocando o Brasil como o segundo no ranking mundial de acesso às redes sociais. Assim, a tática empresarial de recorrer a essas ferramentas tem dado certo.

Um estudo feito no fim do ano passado pelo Instituto de Gestão de Excelência Operacional em Cobrança - Geoc, com sede em São Paulo, comprovou o sucesso da procura de inadimplentes pelo Facebook. Com uma lista de 852 devedores de todo o país que tinham débitos em aberto há quase dois anos, os pesquisadores localizaram 613 (73% da mostra) pelo Facebook.

 Esses clientes eram classificados como deslocalizados e deviam financiamento de veículos, cartões de crédito, empréstimo consignado e consórcio.

DF na dianteira

O Distrito Federal saiu na frente com a localização de 83% dos devedores via rede social, contra 72% na média nacional. Acredito que esse número alto de Brasília se deve ao grande fluxo migratório da cidade. Muitas pessoas vêm de outros estados, mudam telefone, endereço, e fica complicado de encontrá-las, avalia Tatiana Pomar, uma das autoras do estudo.

Uma empresa paulista, do ramo de cobrança, com clientes em todo o país, incluiu o Facebook entre as suas ferramentas de busca de devedores. O diretor operacional José Augusto de Rezende Júnior explica que, a princípio, a instituição usava a página de relacionamentos para encontrar pistas do devedor. 

Ao acessar o perfil, descobria onde o internauta estava morando. Com o nome, a cidade e a ajuda da lista telefônica, a empresa chegava ao inadimplente.

Mas as empresas de cobranças estão indo além. Se o contato telefônico não for possível, além de ser usado como uma base de consultas, elas passaram a deixar mensagens privadas nas páginas dos usuários de modo a tentar uma negociação. 

Ainda estamos implantando esse sistema, mas o que percebemos, pelo menos na geração Y, de 20 a 30 anos, é que eles preferem ser cobrados virtualmente do que por contato pessoal ou telefônico , revela José Augusto.

O problema das mensagens é que nem sempre elas são feitas por instituições sérias de cobranças. Raul (nome fictício), 61 anos, foi vítima de falsos profissionais na rede. O assessor tem o hábito de adicionar qualquer pessoa que o convida para ser amigo do Facebook. Um dia, ao acessar a página, viu um recado de um desconhecido que pedia o endereço da sobrinha. 

A pessoa se justificava dizendo que precisava acertar umas coisas com ela. Tenho um sobrenome diferente, aí o cobrador me localizou por causa do sobrenome e começou a me mandar mensagens estranhas, quando eu entrava no perfil dele, não tinha nada, contou. Resolvi apagar a mensagem, completa.

Proteção

Para evitar cair em ciladas e passar dados pessoais para desconhecidos, a Promotoria de Defesa do Consumidor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) sugere que o cliente confira se a dívida é dele. Todo mundo sabe o que deve. O consumidor precisa avaliar a coerência da cobrança , indica o promotor Trajano de Sousa de Melo.

O método de cobrança é tão novo que os órgãos de defesa do consumidor do DF, como o Procon e Ministério Público, ainda não receberam nenhuma demanda do gênero. De acordo com o advogado José Vieira Alves, presidente da Comissão de Direito do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil, seção DF, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) precisa ser modernizado. Por enquanto, a única cobertura prevista na lei é em relação ao consumo de bens por sites de compras. Em relação a cobranças e a outras relações comerciais na internet o código não é específico , explica.

Para proteger o inadimplente de abusos, a saída é encaixar a situação em alguma genérica prevista pelo CDC. O código diz que o devedor não pode ser exposto ao ridículo ou a ameaça. Assim, se o cobrador deixar um recado nas mensagens restritas, não tem problema, é como enviar uma carta, só ele tem acesso, mas se a cobrança for no mural, entendemos que o objetivo é constranger o devedor , explica Trajano de Sousa de Melo, promotor de Defesa do Consumidor do MPDTF. 

Confirmada a situação vexatória, o cliente pode entrar na Justiça pedindo danos morais à empresa de cobrança.

O que diz a lei

De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, o inadimplente não pode ser submetido a situações vexatórias durante a cobrança de uma dívida. O artigo 42 estabelece que o consumidor não pode ser exposto ao ridículo, nem ser submetido a constrangimento ou ameaça.

O artigo 71 prevê pena de detenção de três meses a um ano e multa para aquele que utilizar, na cobrança de dívidas, ameaça, coação, constrangimento, ou qualquer procedimento que exponha o consumidor ao ridículo ou interfira em seu trabalho, descanso ou lazer.