Esse modo de vida pode parecer perturbador e até mesmo assustador




Shopping centers não foram criados para serem sinistros. Ainda assim, em 1977, George A. Romero escolheu um shopping deserto para filmar algumas sequências de O Despertar dos Mortos, seu cult de horror zumbi. Sem vida e sem luz, as enormes galerias vazias do local assumiram um ar assustador.

Curiosamente, o cenário de Romero tem muito em comum com imagens que recentemente vieram à tona de shopping centers abandonados espalhados por todo o território americano.

Hoje, há provavelmente mais de cem dessas criaturas inanimadas de aço e concreto espalhadas à beira das grandes avenidas dos subúrbios do país.

A crise econômica em várias regiões, principalmente no Meio-Oeste, combinada com uma acelerada ascensão das compras pela internet e com novos modelos de centros urbanos de comércio, empurrou o então aparentemente imbatível shopping center americano para a decadência.

Muitos ainda são bastante frequentados e estão sendo ampliados ou reformados, mas os "shoppings fantasmas" estão rapidamente se tornando as "cidades fantasmas" do século 21.

Do lado de dentro, os milhares de metros quadrados de decoração kitsch parecem mais melancólicos do que um parque de diversões fechado. Todo aquele mármore, todos aqueles azulejos e as largas escadarias no estilo hollywoodiano parecem inúteis e um tanto comovedoras.

Ainda mais tocantes porque os primeiros shoppings dos Estados Unidos não foram erguidos para ficar a quilômetros de distância de grandes centros urbanos, acessíveis apenas de carro.

Victor Gruen, o "pai do shopping center", os idealizou como ponto de referência no coração de áreas onde novos e aprazíveis bairros seriam erguidos.

Nascido em Viena em 1903, Gruen era um socialista ferrenho que estudou arquitetura em sua cidade natal antes de abandoná-la rumo a Nova York, na época da anexação da Áustria pelos nazistas, em 1938. Ele acabou projetando o primeiro shopping center fechado do mundo, o Southdale Center, em Edina, Minnesota. Era 1956.

As casas, escolas, lagos e parques que Gruen havia imaginado continuaram sendo um sonho, enquanto os habitantes de Edina e, posteriormente, do resto do país faziam suas compras em edifícios climatizados cada vez maiores e cada vez mais kitsch.

O shopping center virou um local de passeio, além de ter se tornado uma parte fundamental da cultura americana contemporânea e um modelo para muitos outros países que desejavam reproduzir o American way of life.

Hoje, os grandes shoppings estão em várias partes do mundo. O maior deles é o New South China Mall, em Dongguan, na China, com uma área 20 vezes maior do que a Praça de São Pedro, no Vaticano, e com mais do dobro do tamanho do King of Prussia Mall, na Pensilvânia, o maior dos Estados Unidos.

Entre os dez maiores shoppings do mundo, dois estão no Irã, enquanto outro gigante acaba de ser erguido em Bangladesh, um país com um PIB per capita quase 50 vezes menor do que o dos Estados Unidos.


Porém nos Estados Unidos, em si, a tendência estancou. Em meados dos anos 90, surgiam 140 novos shoppings por ano no país. O freio foi acionado em 2007, o primeiro ano em quase meio século em que nenhum desses centros foi construído.


A recessão levou muitos estabelecimentos americanos a fechar suas portas. E, como tinham sido construídos em uma escala cada vez mais ambiciosa, nunca foi fácil convertê-los para novas finalidades.
Dias contados?

O mundo continua indo às compras freneticamente, mas, como a experiência americana mostra, alguns modismos também passam.

Como arquitetura, e como fenômeno social e econômico, os shoppings falam muito sobre a forma como gastamos dinheiro e vivemos nos últimos 50 anos.

Ao olharmos as fotografias de prédios abandonados, esse modo de vida pode nos parecer perturbador e até mesmo um pouco assustador.


BBC Brasil

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