CARRO


Estados exigem registro em cartório de compra de carro


TONI SCIARRETTA
da Folha de S.Paulo

A redação omissa de um artigo do Código Civil, que entrou em vigor em 2003, está levando o registro de compra de veículos, feito até então exclusivamente nos Detrans (Departamento Estadual de Trânsito), também para os cartórios, como acontece com os imóveis.

O registro nos cartórios diz respeito apenas aos contratos de financiamento, que englobam 66% dos cerca de 3 milhões de carros que deverão ser emplacados no país em 2008.

Em jogo, está um negócio com receita de até R$ 720 milhões anuais estimados com eventuais custos adicionais de registro, que podem chegar a R$ 500 cada um. Em São Paulo, que tem a menor tabela, os preços vão de R$ 69 a R$ 207.

Alegando falta de estrutura administrativa, entre outros motivos, os Detrans dos Estados de Goiás, Ceará, Rio de Janeiro, Paraíba, Rio Grande do Norte e Piauí e o Distrito Federal firmaram convênios para o duplo registro com os cartórios. O mesmo aconteceu em Santa Catarina e em Mato Grosso do Sul, mas o convênio foi suspenso por liminar da Justiça.

"O cadastro do Detran é para fiscalização, não o registro de uma relação comercial. Aos poucos, todos os Detrans estão passando esse trabalho para os cartórios", disse Horacio Melo, diretor do Detran de Goiás.

Em São Paulo, o Detran segue fazendo os registros dos contratos, enquanto há incerteza sobre a evolução do caso no Congresso e na Justiça. Segundo Patricia Ferraz, presidente da Anoreg-SP (Associação dos Notários e Registradores de São Paulo), o Detran paulista tem interesse em trabalhar com os cartórios. O Detran-SP nega a intenção.

Pela proposta, o ônus burocrático e os custos adicionais ficarão a cargo dos bancos, que são os beneficiários dos contratos de leasing e de alienação fiduciária, em que o dono cede a posse do veículo em garantia.

Instituições financeiras protestam alegando que o aumento da burocracia e dos custos tornarão os financiamentos caros. "A compra de veículos tem hoje as menores taxas do mercado, mas o duplo registro vai encarecer isso. Se o objetivo é dar conhecimento se um veículo está alienado, a melhor forma é consultar só o Detran. Se isso pegar em São Paulo, vamos precisar pegar certidão em dez cartórios. Só interessa aos cartórios", disse Osmar Roncolato, diretor da Abel (associação das empresas de leasing).

"Não é verdade que terá de percorrer dez cartórios. Basta ir até a central de distribuição. O sistema se desenvolveu muito. Temos inclusive condições de fazer o registro [eletrônico] por meio de certificação digital", disse Patricia Ferraz.

Além de maior segurança jurídica, os cartórios alegam que os bancos já cobram o registro por meio da TAC (Taxa de Abertura de Crédito) e que tomaram para eles a função do cartório, uma vez que criaram o SNG (Sistema Nacional de Gravames), uma rede privada que abastece diretamente os Detrans com informações sobre a situação de cada veículo. "O mais grave é que consumidor não fica com a cópia do contrato", disse Rogério Bacelar, presidente nacional dos notários.

A disputa chegou ao Congresso Nacional na forma de dois projetos de lei -um que altera a redação do artigo 1.631 do Código Civil, que trata da alienação fiduciária, e outro que pede a fiscalização do convênios feitos pelos Detrans. Ambos já passaram pela Comissão de Defesa do Consumidor do Senado, em que prevaleceu a visão de que os registros fiquem só nos Detrans.

Para Alfredo Peres, diretor do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), a melhor forma de saber se um veículo está alienado é pelo documento do carro, expedido pelo Detran. "Fora isso, é abusivo."

A presidente da AND (Associação Nacional dos Detrans), Mônica Melo, concorda com o Denatran, mas admite que o assunto divide os associados. "O ideal é que os Detrans desenvolvam sistemas para os registros", afirma.

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