NEGÓCIO DO LIXO


Sujeira recorde

A produção de lixo dobra em quinze anos
e se torna um grande problema nas cidades



A cada 24 horas, o Brasil produz 240.000 toneladas de lixo -- sujeira que seria suficiente para lotar 1.160 aviões cargueiros do tipo Boeing 747. O volume de lixo doméstico duplicou nos últimos quinze anos em virtude do aumento do poder aquisitivo e do perfil de consumo dos brasileiros. Hoje, compram-se muito mais produtos industrializados que na década passada, incluindo alimentos e bebidas. São toneladas de embalagens de leite longa vida, montanhas de copinhos de iogurte, miríades de garrafas não retornáveis de refrigerante e fraldas descartáveis, entre outras coisas. O problema é que, enquanto a população adquire hábitos de Primeiro Mundo e consome produtos de melhor qualidade, o tratamento do lixo continua sendo de país pobre. Hoje, 95% de tudo o que é jogado fora não recebe nenhum tipo de tratamento e vai parar em lixões, onde alimentará ratos e urubus, poluirá o solo e as águas subterrâneas. Em 1982, cada brasileiro jogava fora meio quilo de lixo por dia. No ano passado, a média foi de 750 gramas per capita. Ainda é pouco comparado com o Japão, onde cada habitante produz 2 quilos de lixo ao dia. A diferença é que o Japão esconde o lixo pagando aos países vizinhos que se dispõem a receber a sujeira, enquanto o Brasil despeja quase tudo a céu aberto, onde o material pode levar 400 anos para se decompor.

A superprodução de lixo reflete mudanças de hábito entre os brasileiros. "Nos anos 60, as pessoas preparavam massas e maionese em casa", exemplifica Walter Capello Júnior, diretor da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública, Abrelp. "Hoje, compra-se tudo pronto." Um único hipermercado, como os que existem no Rio de Janeiro ou em São Paulo, gera 10 toneladas de lixo por dia. Outra mudança é o chamado lixo tecnológico. Com a troca cada vez mais freqüente de produtos como computadores e televisores, cria-se também um tipo de lixo mais perigoso. As pilhas usadas, por exemplo, liberam cádmio, e a tela dos televisores deixa vazar chumbo. "Essas substâncias se infiltram na terra, contaminam o lençol freático e podem entrar na cadeia alimentar", preocupa-se Carlos Alberto Venturelli, diretor do Limpurb, departamento que cuida do lixo da prefeitura de São Paulo.

Desperdício -- Esses são problemas de todos os países industrializados. Mas o brasileiro adiciona a eles o péssimo hábito de jogar comida fora. Nos Estados Unidos, considerados pródigos em desperdício de alimentos, 30% do lixo produzido é orgânico. Em Curitiba, uma das cidades brasileiras onde os resíduos são mais bem tratados, o índice bate nos 66%. "O Brasil precisa definir logo o que fará com seu lixo", critica o professor de engenharia sanitária e ambiental João Tinoco, consultor da Organização Mundial de Saúde. Os projetos dos governos para enfrentar a questão são pífios. Menos de 3% do lixo passa hoje por processos de compostagem (transformação em adubo) ou incineração. Apenas 2% é reciclado. Há uma explicação para esse descaso. Reciclar lixo é quinze vezes mais caro do que jogá-lo num aterro. Por isso, em países como a França e a Alemanha, é a iniciativa privada que se encarrega do problema. Fabricantes de embalagens e produtos poluentes são considerados responsáveis pelo destino final de seus produtos, e o consumidor é convidado a dar uma mãozinha na reciclagem. Assim, para comprar uma pilha nova, é preciso entregar a usada ao vendedor.
FONTE: VEJA.