Veterano em tocaia de aprendiz
A estratégia de FeijóO roteiro dos ataques desferidos pelo secretário Cézar Busatto contra o vice-governador Paulo Afonso Feijó não resultou de uma reflexão solitária. Busatto escreveu à mão, numa folha da papel, as palavras-chave que seriam soletradas com ênfase na entrevista coletiva de sexta-feira à tarde, quando condenou o fato de o vice ter gravado a conversa entre os dois. Estavam anotados: "golpista e "mau-caráter.
O secretário fechou o roteiro depois de refletir sobre a calibragem da resposta com pelo menos cinco colegas de governo. Quando fez as anotações do que iria dizer, estavam no gabinete o marido da governadora Yeda Crusius e presidente do Conselho de Comunicação do Piratini, Carlos Crusius, o secretário de Comunicação, Paulo Fona, o secretário do Desenvolvimento, Fernando Záchia (PMDB), a subsecretária da Casa Civil, Iara Wortmann, e a chefe de imprensa de Busatto, Jandira Feijó. Busatto fechou o roteiro e subiu ao gabinete da governadora. Yeda concordou com o tom do que seria dito. Busatto deveria bater forte em Feijó.
Encerrada a coletiva, o secretário retornou ao seu gabinete, onde estavam a mulher dele, Clênia Maranhão, secretária de Coordenação Política da prefeitura de Porto Alegre, e os filhos, Carlos Ernesto e Leonardo. Havia pisado na sala quando uma assessora de Yeda abriu uma porta lateral e avisou:
- A governadora mandou chamá-lo.
Yeda queria cumprimentá-lo. Busatto partira para o ataque, com o apoio da governadora, depois de ser acalmado por assessores. No meio da tarde, quando a Rádio Gaúcha anunciava que a gravação da conversa seria divulgada, Busatto telefonou para a mulher e os filhos e chorou.
- Ele é pura emoção, é passional e está indignado - disse um assessor.
Secretário foi informado da gravação por deputado
O secretário sabia da gravação da conversa desde quinta-feira. Às 10h, recebeu na Casa Civil o presidente estadual do PP, deputado Jerônimo Goergen, que o informou que conversara com Feijó. O deputado estadual Pedro Westphalen, também do PP, acompanhava Goergen. Assim que terminou o encontro, Busatto avisou a governadora. Depois, telefonou para Feijó, que confirmou a gravação.
- Tenho por hábito gravar todas as minhas conversas - teria dito.
Busatto fez um pedido:
- Já que o senhor me gravou, pode me dar uma cópia?
Feijó teria concordado em ceder uma cópia do CD, que não foi enviada a Busatto. O chefe da Casa Civil foi alertado por sua assessoria, ontem à tarde, de que a gravação seria divulgada pela rádio e que uma cópia havia sido enviada à CPI do Detran. Abateu-se. Estranhou que tenham sido divulgados 20 minutos de uma conversa que teria durado em torno de uma hora. Queixou-se porque sua voz é quase inaudível na gravação, enquanto as falas de Feijó são claras, assertivas, categóricas.
Ex-integrante do MR-8, Busatto se descobriu como apaziguador
Busatto tem 56 anos e quase quatro décadas de militância política. Já desempenhou todos os papéis como militante e como homem público. Foi o Busattinho agitador de esquerda do clandestino MR-8, que se aninhou no MDB, nos anos 1970, e incomodava o cacique Pedro Simon por sua radicalidade. Foi um secretário da Fazenda privatizante do governo Antônio Britto e de uma fracassada candidatura como opção antipetista à prefeitura, na década de 90, até se descobrir, nos últimos anos, como negociador e moderador.
Desembarcou no governo Yeda em fevereiro, com a tarefa de ser um apaziguador, um gestor de atritos. No episódio da gravação, foi abalado não só pela revelação da conversa e pela constatação de que fracassara na missão de acalmar Feijó. Busatto submeteu-se ao constrangimento, depois de tantos anos de convivência com velhas raposas da política, de admitir, no papel de vítima, que caíra na tocaia de um aprendiz.
O chefe da Casa Civil fez um apelo, na coletiva, para que leiam o que escreveu. Busatto é autor, com a jornalista Jandira Feijó - que não tem parentesco com o vice - , de A Era dos Vagalumes - O Florescer de uma Nova Cultura Política, publicado em 2006. O livro lamenta que "o poder público se auto-alimente pelos interesses corporativos de partidos que muitas vezes representam parcelas e grupos que não têm compromisso público. Defende a construção de uma "coesão política sincera, em substituição ao "horror político" da partilha do poder entre simpatizantes partidários. A gravação feita por Feijó expõe Busatto pelo inverso, pela defesa da gestão do possível, com partilhas e loteamentos de recursos e cargos públicos. O título do livro tem essa explicação: "Vaga-lumes assumem compromissos individuais e suas atitudes contagiam o meio onde estão inseridos".
A assessores, o secretário vem repetindo que este ano pretende realizar um programa adiado na juventude. Quer finalmente conhecer Machu Picchu, as ruínas dos incas no Peru. Chegou a considerar a hipótese de fazer o Caminho de Santiago, na Espanha. Prefere Machu Picchu. Mais bem-humorado e espiritualizado, depois de enfrentar e superar um problema sério de saúde no ano passado, Busatto refere-se inclusive aos adversários políticos como "meu irmão". No prefácio de A Era dos Vagalumes, Busatto cita o físico austríaco Fritjof Capra, o filósofo da física quântica: "A esperança não é a convicção de que as coisas vão dar certo, mas a certeza de que as coisas têm sentido, como quer que venham a terminar.
*Colaborou Marciele Brum
( moises.mendes@zerohora.com.br )
MOISÉS MENDES
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