FOFOCA


Não conte para ninguém

Conheça os resultados de um
estudo americano sobre por que
gostamos tanto de fazer fofoca

O ZUNZUNZUM FEMININO

As mulheres adquirem o hábito da fofoca ainda na infância
Falam de tudo, sobre todos
Deleitam-se, porém, em falar da infidelidade conjugal e da promiscuidade sexual de outras mulheres

Não importa o momento histórico, tampouco a cultura. O fato é que a humanidade não passa sem fofoca. Mas o que explica esse impulso quase incontrolável de falar (e ouvir) sobre a vida alheia? Inveja? Falta do que fazer? Despeito? Não, nada disso. Essa compulsão é puro instinto. Isso mesmo – instinto de preservação da espécie. O psicólogo americano Frank McAndrew acaba de publicar um trabalho na revista Journal of Applied Social Psychology em que defende a teoria de que a fofoca é parte universal da experiência humana. "Determinados comportamentos e atitudes ajudaram nossos ancestrais ao longo da evolução: quem comia os alimentos corretos, escolhia para parceiro sexual os melhores reprodutores e estava mais bem informado sobre o que acontecia ao seu redor revelava-se mais apto para superar as adversidades do meio", disse McAndrew a VEJA. "Aqueles que tinham forte interesse pelo que acontecia com os outros possuíam uma grande vantagem sobre os que não davam importância a esse tipo de informação." Portanto, não se acanhe, prezado leitor, em aguçar os ouvidos da próxima vez em que escutar o fatídico "nem te conto...". Se alguém chamá-lo de fofoqueiro, argumente ser impossível resistir a um hábito adquirido há cerca de 4,5 milhões de anos, quando os primeiros hominídeos desceram das árvores e passaram a equilibrar-se sobre duas pernas.

A pesquisa de McAndrew foi dividida em duas etapas. Na primeira, ele entrevistou 128 pessoas, homens e mulheres de 17 a 62 anos. A cada uma, ele apresentou artigos colhidos de revistas e jornais especializados em fuxicos sobre celebridades. O psicólogo então pediu a cada um dos participantes que elencasse as reportagens mais interessantes. McAndrew tirou daí a primeira conclusão de seu trabalho: homens preferem ler sobre homens, e mulheres, sobre mulheres. Mais: as pessoas têm maior curiosidade a respeito de celebridades que estejam na sua faixa etária. No Brasil, sabe-se que as mulheres de 50 anos se deleitam com mexericos a respeito da vulcânica Vera Fischer. E as moçoilas regalam-se com novas sobre Gisele Bündchen. De acordo com o psicólogo McAndrew, na luta pela perpetuação da espécie, em busca do reprodutor ideal, Vera é uma ameaça às cinqüentonas. E Gisele, às jovenzinhas.

A segunda fase da pesquisa de McAndrew foi ainda mais reveladora. Ao entrevistar 83 estudantes – 39 homens e 44 mulheres, com idade entre 17 e 22 anos –, o psicólogo fez uma radiografia da fofoca. Conseguiu provar que as mulheres são, mesmo, mais fofoqueiras que os homens. Elas se interessam por qualquer assunto, não importa o sujeito do mexerico. Se também for do sexo feminino, nem te conto... E essa avidez por ouvir e falar da outra aumenta ainda mais quando o que se tem para contar versa sobre a promiscuidade e a infidelidade da colega. "As mulheres usam esse tipo de informação para manipular a reputação das outras", explica McAndrew. Do ponto de vista evolucionário, nada mais lógico. A explicação do psicólogo: ao difamar uma rival, ao espalhar que ela é infiel ao parceiro ou tem muitos amantes, o que a mulher pretende, no fundo, é afastá-la dos machos provedores. Na época em que o teste de DNA não existia, a paternidade só podia ser garantida pela certeza de fidelidade da companheira. Minar a reputação do concorrente para assegurar a transmissão dos genes é um comportamento tão intrínseco à espécie humana que o homem, ainda que pouco afeito à futricagem, é todo ouvidos quando o que se tem a falar diz respeito à situação financeira e à habilidade sexual dos rivais. Boa reprodutora que se preze não dá a menor bola para um pobretão ou para um sujeito com dificuldades no sexo.

O FALATÓRIO MASCULINO

Eles tendem a ser menos futriqueiros que elas
A fofoca deles tem caráter competitivo
Quando abrem a boca, preferem comentários sobre as finanças e habilidades sexuais dos outros

A mordacidade típica da fofoca feminina é característica que as mulheres adquirem ainda pequenas, na infância. "Por volta dos 8 anos, a agressividade e a competitividade afloram. É o momento em que as meninas começam a se dedicar aos jogos de intrigas, segredinhos e pequenas traições", diz o psiquiatra e psicoterapeuta Eduardo Ferreira-Santos, do Hospital das Clínicas de São Paulo. Enquanto as pequenas se dedicam ao zunzunzum, os meninos extravasam a agressividade e a competitividade nas brincadeiras de luta. "Entre os homens, a fofoca tem mais caráter competitivo, interpretado no maior interesse que eles têm por temas que abordem outros homens, nos aspectos predominantemente financeiros e sexuais", afirma o doutor Ferreira-Santos. "Esse tipo de fofoca é uma revivescência, na idade adulta, das práticas tão comuns quanto escondidas na adolescência – as aferições de tamanho de pênis ou de poder de jato da urina."

Na pesquisa, os estudantes foram categóricos ao afirmar que, se tivessem de optar entre um amigo e um parente como sujeito da notícia a receber, em apenas duas situações escolheriam alguém da família. Em caso de recebimento de uma herança ou de doença grave. Portanto, o amigo é um alvo preferencial de fofoca. Esse é um dado revelador na pesquisa do psicólogo McAndrew. Quando os amigos se tornam o alvo da fofoca, queremos saber tudo. No fundo, no fundo, tamanha curiosidade deve-se à consciência – ainda que inconsciente – de que eles são nossos amigos hoje, mas amanhã podem deixar de ser. E aí... "Os amigos são importantes para nós porque são aliados que nos ajudam", diz McAndrew. "Mas, porque sabem muito sobre nossa vida, eles podem nos prejudicar muito se viram nossos inimigos."
KARINA PASTORE
Fonte: Veja